1 Outro Ponto

1 Outro Ponto

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Eleição acontece todo dia.

De dois em dois anos a história sempre se repete. Surgem, de repente, cartazes, flyers, placas e cavaletes políticos, com a imagem de uma pessoa, de um partido qualquer e de quatro números editados no Photoshop.

“Ele é a mudança”. “Eu defendo seus interesses”. “Eu sou o melhor para São Paulo”. “Eu isso, eu aquilo, eu não sei o que...” Frases de efeito desse tipo tentam mostrar a principal qualidade desses políticos.

Mas a verdade é que eles só têm essas qualidades em época de eleições. Depois de outubro, os rostos somem. Os cartazes viram lixos. E as promessas ficam perdidas no tempo e no espaço da realidade.

E a realidade é dura, meu amigo: a maioria desses políticos só quer aparecer e ser famoso durante o período eleitoral. Passado o momento da decisão democrática, optam pelo ostracismo e pelo trabalho oculto de seus gabinetes.

Lá, fazem o que bem entendem, sendo vigiados apenas pela imprensa e por militantes próximos. E às vezes esses dois coletivos também fazem olho gordo esperando algo em troca.

Então, pergunto: quem tem interesse em ser conhecido nas eleições e desconhecido no mandato? Por que a imprensa brasileira cobre política somente em época de eleições? Por que conhecemos os rostos no período eleitoral e desconhecemos os políticos envolvidos num esquema de corrupção? Quem tem interesse que tudo isso aconteça?

Você, logicamente, não. Se você deixa dinheiro no banco, é bom gestioná-lo, verdade? Então como não observar os políticos que votamos?

A Democracia é o poder do povo. Mas como os políticos e a imprensa só tratam profundamente a política de dois em dois anos, que poder é esse?

Como “vigiar” os candidatos que levaram nosso voto através de uma imprensa que só fala de política quando o assunto é corrupção?

Na Europa os tele-diarios abrem falando da agenda dos principais políticos do país. Aqui isso só acontece se esses políticos são Dirceu, Genoíno ou qualquer outro poderoso envolvido em escândalos de corrupção.

Como o povo vai conhecer seus representantes se nem eles nem a imprensa se deixam conhecer?
Ficam lá em seus escritórios milionários achando que o povo não tem conhecimento e educação suficiente para entender esse mundo da política.

Mas, oras, se eles aparecem somente quando interessa e só falam de política quando faz bem a eles mesmos, como esperar que o povo adquira sozinho conhecimento e interesse político? É como exigir que uma criança de 5 anos saiba pescar sem mostrar para ela o que é a vara ou para que serve o anzol.

Seguindo o exemplo, quando a criança demonstra não saber, eles se escondem e aproveitam a situação, aparecendo, mais tarde, pra dizer que é um ótimo pescador. Me poupem!! Que falta de vontade!!

Política é muito mais que corrupção e eleições. Democracia é muito mais que direitos e deveres. Decisões democráticas vão muito além do período eleitoral. E mandatos vão muito além do que aparece no jornal.

De dois em dois anos a história sempre se repete. Mas, como a história se constrói hoje, é hora de acompanhar o que nossos políticos estão fazendo. É hora de dar mais audiência ao jornal (cujos assuntos nos afetam diariamente) do que ao Big Brother (que não passa de entretenimento barato).

Sua vida depende disso. A minha também. E a do Joãozinho, também! Afinal, a vida do Joãozinho e a dos nossos filhos estará condicionada ao que fazemos hoje e ao que fizemos ontem.

Acabando as eleições, o político que levou nosso voto deve ser cobrado e vigiado de perto. Afinal, eles não são superiores ao povo (por mais que eles achem que sim). E, além disso, eles não passam de servidores públicos. Nós somos o patrão, não eles!!!


Podemos participar da política ou ignorá-la diretamente. A escolha é toda nossa. E as consequências, também. 

terça-feira, 10 de junho de 2014

Reflexão de um jornalista

Há mais de uma semana não publico nada no blog. Estava reformulando conceitos sobre minhas publicações; então aproveitei o tempo para rever ideias e reformar valores que considero antiquados em minha forma de encarar o jornalismo e a realidade. Confesso que tive um período de sombras durante toda minha vida. Deixei-me levar por ideais partidários e em muitos momentos cheguei a defender pessoas que, obviamente, também merecem críticas jornalísticas bem fundamentadas. Digo que devem ser fundamentadas porque criticar sem fundamento significa cair no mesmo erro que eu tive durante minha vida inteira: a defesa cega e partidária, digna de um fanático do futebol que considera seu time melhor que os outros mesmo que ele esteja na lanterna. Não. O mundo da política não é assim. Ele se transforma e muda a vida das pessoas, então é preciso abordá-lo com mais seriedade e defender somente quem merece ser defendido.

Mas ninguém em particular nesse mundo é perfeito a ponto de merecer uma defesa cega e fanática dessas. Então, em minha reforma interna conclui que se existe um coletivo que merece defesa nesse país, este está formado pela maioria. Sim, a maioria; vista assim dessa forma genérica e ampla. A maioria no Brasil não necessariamente está formada pelos pobres. Os interesses dela se transformam de acordo com o assunto tratado. Se o tema em pauta é a Democratização dos meios de comunicação, a maioria que se beneficiaria dessa medida não está formada exclusivamente por pessoas que, hoje, não tem voz dentro dos principais meios de comunicação do país. Nesse caso, ela se estende e chega a leitores que nem se consideram parte dessa maioria. Leitores que sequer apoiam essa medida, mas que serão beneficiados com informação plural e democrática. Tendo isso em mente, é possível entender porque defendo a Democratização dos meios de comunicação do país. Não é para prejudicar uma imprensa que bate no PT todos os dias. Mas sim para permitir que os cidadãos recebam informação plural que é direito deles!

Essa simples frase define quem é o patrão dos jornalistas: o leitor.


Defender essa maioria significa defender os interesses do Brasil. Ao entender isso, passei a ver o mundo de outra forma. Mas sempre aparecem problemas com outros temas. E então me pergunto: como definir uma maioria num assunto como a greve dos metroviários em São Paulo? São duas partes muito bem definidas, é difícil estabelecer quem representa a maioria. Nesse caso, meu bom senso me conduz a mediar o conflito. Ou seja, deixar claro para o leitor que todos coletivos têm interesses particulares e que todos têm exigências e interesses. Isso significa dar informação sobre os dois lados da história, sem defender ninguém. Mostrar como a greve foi abusiva em certos pontos e como o Governo do Estado foi inflexível na sua maneira de negociar com os trabalhadores indignados. Em meus antigos valores, eu defenderia somente os trabalhadores, pois os considerava (e ainda considero) a parte mais fraca da briga. E numa briga entre uma foca e um tubarão, eu costumo defender somente a foquinha em perigo, pois enxergo claramente como o tubarão pode se defender sozinho, afinal, ele tem dentes afiadíssimos e escamas difíceis de romper.

Mas hoje essa ideia mudou na prática. Ninguém é santo. Os trabalhadores podem estar lutando por causas justas (ou não; isso não importa nessa reflexão), entretanto, eles também atuaram de forma imprensada em alguns momentos. E agora eu pergunto: como posso defender isso sem cair na hipocrisia de ressaltar informações e ignorar outras? Simples. Eu não defendo. Só deixo claro para quem lê o fato de que todos nós cometemos erros. E é então que eu mostrarei quais são os erros de cada um, ao invés de defender um lado e atacar o outro. Fazendo isso, o leitor que defende o Governo do Estado provavelmente não gostará do que escrevi. E provavelmente quem apoia os metroviários tampouco. Mas isso, em minha cabeça, é reflexo de um jornalismo sério e construtivo. Um jornalismo que não está formado na propaganda, mas sim na intenção de vigiar os poderes, o que vem a ser a função primordial do jornalismo. Apontando erros e acertos de ambas as partes, eu não só faço um balanço neutro da história, como também deixo claro quais são os pontos a melhorar e quais são os pontos que servem de exemplo.

Isso não aconteceu, por exemplo, na cobertura que a Grande Imprensa realizou da mesma greve anteriormente citada. Ela, (como sempre) defendendo os interesses do Governador de São Paulo, ignorou informações importantes: a da catraca livre que foi rejeitada por Alckimin e a da represália que foi realizada para dar exemplo de que “greve não vale a pena” (ontem as partes tinham chegado num acordo, que foi suprimido para não “motivar” outras greves). Mas isso também não aconteceu em alguns blogs de esquerda, que denunciaram a cobertura da Grande Imprensa e ressaltaram os interesses dos metroviários, mas esqueceram do povo que sofre com a greve culpando somente o Governo do Estado e sua falta de diálogo (sendo que os grevistas também atuaram de forma abusiva em certos momentos). Enfim, obviamente os dois coletivos informativos estão corretos, jornalisticamente falando: ambos se mantêm na linha da veracidade, que é a base de um jornalismo aceitável e sério. Mas por que não informar os interesses que cada um tem para que o leitor tenha uma ideia completa do assunto? Somente os autores podem responder essa pergunta corretamente, o resto seria somente especulação e teorias que, apesar de ter uma base real, partem da imaginação.

Bom, amigos, o jornalismo é algo tão profundo, sério e influente que deve ser abordado da forma menos interessada possível, mantendo o foco pelo bem da maioria. Isso não significa ignorar completamente nossas preferências partidárias (eu sempre votarei no partido que me represente melhor minhas ideias, afinal, jornalista também é ser humano), mas é aconselhável deixá-las de lado pelo bem do leitor. Renunciar aos nossos ideais pelo bem da maioria é algo admirável, e essa é a linha do jornalismo que pretendo seguir durante minha vida inteira. É por isso que tenho admiração pelo jornalismo alternativo no Brasil. Ele costuma falar sobre a forma que a Grande Imprensa mostrou um fato e completa a abordagem do mesmo com informações relevantes deixadas de lado pelos principais meios de comunicação do país.  Quem ganha com isso é o leitor, que conhece o lado ignorado dos fatos e quais interesses cada meio de comunicação defende em seus textos. É algo que motiva a crítica e o questionamento do cidadão. É algo bom para a Democracia, onde convivem diversos coletivos com diversos interesses e formas de ver a realidade. Mas é algo ruim para aqueles que temem a liberdade, pois estes têm interesses que considerados mais importantes do que os conhecimentos do cidadão.


Por isso, eu já não olho o mundo com lentes partidárias. Agora busco o melhor para todos. As críticas e os insultos que vou receber não mudarão meu foco. Principalmente porque eles serão reflexos de um ego que tem sua própria visão, entendimento e valores. Mas, se em algum momento você, leitor, me ver defendendo alguém sem considerar as ações e fatos do “outro lado”, por favor, me avise. Prometo modificar minha visão com sua crítica, e dessa forma farei exatamente o que espero que os demais façam quando leiam meus textos.

terça-feira, 27 de maio de 2014

Copa do Mundo: o complexo de vira-lata e a defesa com unhas e dentes

A Copa do Mundo desperta diferentes sentimentos nos brasileiros atualmente. Através desses sentimentos, é possível inclusive descobrir as preferências políticas de um cidadão. Os opositores ferrenhos costumam ter razões políticas para se opor. Os apoiadores incondicionais também têm seus motivos. Dificilmente se encontram discursos equilibrados entre críticas e defesas. Isso porque a Copa é hoje, o foco principal da política nacional. É o campo de batalha entre os atores políticos. O Governo Federal defende o evento com unhas e dentes, enquanto a oposição busca qualquer tipo de falha que permita um ataque político através da imprensa. Além disso, por ser o principal evento de um esporte massivo e extremamente popular, a Copa do Mundo está na boca de todos. Todos opinam sobre o tema. Por isso ela adquiriu um panorama que vai muito além do esporte.


Há algum tempo esse blog publicou um texto sobre a conscientização política e social que a Copa do Mundo FIFA de futebol vem promovendo no Brasil. De repente todos estavam preocupados com a situação dos serviços públicos do país. Educação, segurança, saúde e transporte eramo, e ainda são, temas centrais do evento. Esse reconhecimento de problemas é benéfico para o Brasil. Afinal, reconhecer um erro é o primeiro passo para superá-lo. Entretanto, surge um problema quando o objetivo dos que difundem as críticas não é melhorar o Brasil, mas sim desqualificar certos partidos políticos com objetivo eleitorais. Usam a honesta indignação das pessoas como massa de manobra: quem tem menos interesse por política acaba caindo no discurso “anti-Brasil” e começa a ser contra tudo que o Brasil faz ou produz.

A cobertura da imprensa transmite o "discurso do caos". Ilustração de Vitor Teixeira.

O brasileiro nunca foi muito patriota. Mas o que existe atualmente é uma campanha da imprensa e da oposição contra a Copa do Mundo. Isso cria um "complexo de vira-lata" no brasileiro, que passa a ver o Brasil como o pior país na face da Terra. Mas esse detalhe tem um fundo oculto. Acontece que o PT trouxe a Copa do Mundo e, se o evento for um sucesso, o partido será aplaudido, o que significaria o fim das aspirações políticas da oposição. Esta, então, representada pela imprensa, ignora as notícias e dados positivos sobre o Mundial, dando ênfase às notícias negativas e buscando o desgaste político com o evento, o que se traduz em dano à reputação petista. Ou seja, a oposição, hoje, deseja o fracasso do Mundial para obter vantagens eleitorais. A questão chave para a oposição, nesse caso, não é a imagem que os estrangeiros terão do Brasil, mas sim a imagem que os próprios brasileiros terão do Brasil (afinal, estrangeiro não tem poder de voto).

Isso se vê claramente com o ex-astro do futebol Ronaldo Nazário. Membro do Comitê Organizador Local da Copa do Mundo, o Fenômeno de repente mudou seu discurso sobre a Copa, antes favorável somente ao Governo Federal e à organização do evento. Pouco antes de divulgar seu apoio político à Aécio Neves (com quem tem amizade há 15 anos, segundo o próprio), Ronaldo deu entrevistas criticando duramente os preparativos. Nesse caso, existe relação direta entre o discurso assumido e o apoio declarado. Por dar um exemplo: o jornal GGN publicou uma matéria de Pablo Villaça, que atua no Cinema em Cena e mostrou em seu blog o que chamou de “cronologia de um demagogo”. Segundo a matéria, “Villaça resgatou as principais declarações de Ronaldo sobre a realização do evento e o momento exato em que o fenômeno parece mudar de opinião”.

Esses são os fatos relatados por Villaça. No dia 21 de fevereiro, Ronaldo afirmou que está“animado” para a Copa de 2014. Depois de um mês, postou uma foto de apoio à candidatura de Aécio Neves. E vinte dias depois, começam as entrevistas, onde se diz“envergonhado” com a preparação da Copa, entre outras declarações anti-Copa.

Entrevista de Ronaldo publicada na capa da Folha de S. Paulo essa semana

É um claro exemplo de que a Copa do Mundo e as eleições vêm polarizando a sociedade. As pessoas escolhem um lado de acordo com suas preferências políticas: se apoiam o Governo, são à favor da Copa, se se opõem, são contra. Quem apóia, não deixa de buscar motivos para apoiá-la (principalmente se conta com motivos eleitorais para isso). Quem se opõe, encontra facilmente motivos para odiá-la (principalmente se tem motivos eleitorais para isso). O certo é que a realidade é muito mais complexa que essas simplificações partidaristas. Nenhum evento é perfeito. Mas nenhum é um completo fracasso a ponto de não ter nenhum ponto positivo. Nesse sentido, cada um acredita no que quer. Obviamente aqueles que apoiam o Governo Federal acreditam no sucesso do evento. E obviamente a oposição vai acreditar que “o Brasil está perdido”.

O correto é chegar à um equilíbrio bem delimitado. Não é necessário ser "contra o Brasil" para criticar a Copa do Mundo. É possível criticar e questionar o lado injusto dela enquanto se comemora os gols do Brasil. Não há razões que não sejam políticas para se opor ferrenhamente ao evento ou para defende-lo incondicionalmente. A FIFA não pagou impostos dos bens trazidos ao Brasil, o que é injusto e deve ser questionado e discutido. Por outro lado, isso não quer dizer que a Copa está sendo péssima para o país. Dizer algo tão extremo é errado, pois a realidade dificilmente tem somente um lado. Sempre há outros pontos de vista e outros dados que não são enfocados. Por isso é errado ser radical com a Copa do Mundo.

Seguindo essa linha de pensamento, é bom lembrar que auto-crítica é positiva, mas somente quando ela tem um viés construtivo. Criticar é bom. É saudável para a Democracia. Sem critica os políticos governam sozinhos e não existe representação, mas sim imposição. Mas não é isso que os opositores ao mundial vem pregando. Dão ênfase somente ao caos e à destruição; o que é ruim para o Brasil e para o estado de espírito das pessoas, que, enganados pelas meias-verdades publicadas pela mídia, acabam odiando algo que também trará benefícios do Brasil, apesar de todas injustiças sociais e das preferências injustas concedidas à FIFA. 

Por outro lado, o Governo também poderia ser mais transparente deixando de esconder os lados “feios” da Copa. Claro que em época de eleições eles têm muito a perder falando dos pontos negativos, e claro que a imprensa já faz esse papel, mas o Governo do PT ganharia muita credibilidade se lutasse somente à favor do povo e não da FIFA, e se apostasse na transparência dando apoio político aos manifestantes, ao invés de se distanciar, como vem fazendo nos últimos anos. 

Enfim, existe um conflito de interesses ao redor da Copa do Mundo. Em 15 dias o panorama provavelmente mudará, principalmente porque já vêm mudando nos últimos dias. Muitas pessoas aceitaram o #vaitercopa e sabem que é mais eficiente protestar nas urnas que nas ruas (pelo menos nesse tema). Enquanto isso, outros movimentos sociais aproveitarão os holofotes do mundo para dar ênfase as suas causas. Foi o que professores cariocas em greve fizeram ontem com a chegada da Seleção Brasileira à Granja Comary. Usaram a imagem da seleção brasileira para dar ênfase à sua luta. Os jogadores não têm culpa de nada, mas serão usados como meio de obter causas justas (os professores querem aumento de 20% no salário, redução da carga horária dos servidores administrativos, plano de carreira unificado para a categoria e eleição direta para diretor de escolas). Esse holofote que mostra os problemas de certos coletivos é um dos pontos positivos da Copa quando as causas são justas, e não eleitorais.

É importante que o leitor abra os olhos e tente entender o papel de cada ator da Copa do Mundo. Quase todos têm lado nessa guerra política. Conhecendo o lado de cada um será possível saber “quem é quem” e “quem defende o que”, o que é muito útil na hora de desenvolver aquela consciência política que a Copa do Mundo motiva e que foi citada no começo do texto. Então, leitor, não caia na balela dos políticos ou da mídia. Eles têm muitos interesses à defender e nunca abrirão mão deles. Seja crítico com as injustiças do Mundial e aproveite essa festa porque ela será bonita apesar de tudo. Nada levado ao extremo é positivo. Por isso é necessário abordar o tema da Copa com equilíbrio e seriedade, evitando paixões partidaristas que não passam de interesses mesquinhos e, muitas vezes, são fruto de manipulações sem pudor.


quarta-feira, 21 de maio de 2014

A greve de ônibus é política

Existe muito mistério ao redor da greve de ônibus que contribuiu com os 261 Km de trânsito São Paulo, o recorde do ano. Tudo aponta que se trata de uma disputa política interna do Sindmotoristas, o sindicato da categoria. Seria uma disputa política entre oposição e o atual presidente, Valdevan Noventa. Mas, mesmo assim, muitas perguntas continuam no ar e devem ser respondidas nos próximos dias.

Ônibus parados durante a greve. Foto da Folha de S. Paulo


Por que os trabalhadores fizeram greve logo depois de fechar a Campanha Salarial do ano? Essa versão da história é altamente contestável: o que os trabalhadores ganham fazendo uma greve sem reivindicações e sem nenhum tipo de intenção de diálogo? É como se uma criança mimada chorasse, conseguisse uma mamadeira e continuasse chorando sem motivo. O que a mãe faz com uma criança dela? Dá uma bronca, logicamente. Mas, o que a criança ganha com isso?

O prefeito Fernando Haddad deu a bronca nos grevistas. Ontem declarou que a greve é uma “guerrilha inadmissível”, como publica o diário Brasil 247. “Como você entra no ônibus e manda o passageiro descer? Coloca o ônibus na transversal e joga a chave fora”, questiona. O prefeito, em entrevista à Rede Bandeirantes, considerou um “absurdo” a atuação da minoria que fez greve mesmo depois das conquistas para a categoria. Haddad também criticou a passividade da Polícia Militar, que foi acionada e poderia ter atuado ao ver os ônibus abandonados no meio da rua.

Passageiros esperam pelo ônibus parado

A questão é que os trabalhadores do sindicato conseguiram as reivindicações que pediam: 10% no salário, ticket mensal de alimentação de R$445,50, melhoria dos produtos da cesta básica, fim do genérico, aposentadoria com 25 anos de trabalho, entre outras. Mas, aparentemente, as conquistas não agradaram aos motoristas e cobradores da cidade, uma minoria que iniciou a greve sem nenhum tipo de comunicação e sem nenhum tipo de lógica trabalhista. Simplesmente entraram em greve, o que surpreendeu até o sindicato, que expressou em nota sua intenção de investigar o que motivou a paralisação de cobradores e motoristas.

Uma coisa é certa: os grevistas são apenas a ponta do iceberg. Nenhum trabalhador atuaria dessa forma, colocando seu ganha pão em jogo, para lutar “sozinho” numa causa que sequer apresenta reivindicações. Diante da falta de explicações, começam a brotar n Internet diversas teorias com cara de conspiração. Mas, como toda teoria conspiratória, elas não passam de boatos e conclusões individuais publicadas e identificadas por leitores. A realidade quase nunca aceita teorias desse tipo.

Vendo isso, a ideia de que a disputa interna dosindicato teria motivado a greve aparece como a causa mais provável. Fala-se em probabilidade, pois não existem publicações, diálogos, manifestações e queixas públicas por parte dos grevistas. Então somente quem participa do dia-a-dia do sindicato pode saber melhor sobre o que acontece.

O que todos conhecem são brigas entre oposição e governo do Sindmotoristas. A disputa pelo poder no sindicato já crioutranstornos. As eleições que colocaram Valdevan Noventa no controle do sindicato seriam realizadas em julho do ano passado, mas uma confusão derivou em tiroteio e a disputa foi adiada para outubro do mesmo ano, quando o atual presidente, que na época representava a chapa de oposição, ganhou do então presidente Isao Hosogi, conhecido como Jorginho. Ambos trocaram acusações deenriquecimento ilícito e ligação com o crime organizado (com o PCC, precisamente) durante a campanha, segundo informação da Agência Estado.


Vendo todo esse panorama, é possível concluir que a greve é política, principalmente considerando que as exigências econômicas da categoria foram atendidas. Mas muitas perguntas ficam no ar: o que pretendiam os grevistas, quem os comanda e como a sociedade pode conhecer o que causou tantos transtornos na cidade. Talvez a imprensa responda algumas  dessas perguntas em alguns dias. Até lá, o paulistano deverá se conformar e tirar suas próprias conclusões sobre o tema.

terça-feira, 20 de maio de 2014

A importância da Democratização dos meios de comunicação

“Quem tem medo da liberdade teme mais Democracia no Brasil”.

Quais são os princípios de uma Democracia? Diversidade, conflito de opiniões e convivência de pensamentos diferentes são democrático são democráticos. Agora, quais são os princípios de uma Ditadura? Discurso único, falta de tolerância e afastamento de ideias diferentes. Certo. Aplicando isso aos meios de comunicação, como seria a imprensa de um país Democrático? Uma imprensa livre e democrática seria uma com variedade de opiniões e representação de todos coletivos da sociedade.


A imprensa vigia o poder público e é a encarregada de formar opiniões que serão usadas pelos cidadãos na hora de exercer o direito ao voto. Quanto mais pontos de vista existentes na imprensa, mais diversidade na opinião pública, pois ela se informa através de diferentes canais e enfoques. Agora, saindo da teoria e entrando na prática, a imprensa brasileira tem essa diversidade de opiniões? Os meios de comunicação com mais audiência demonstram suas preferências políticas e representam diversos coletivos da sociedade? Alguns dirão que sim, mas, conhecendo a fundo a história e linha editorial dos meios de comunicação do país, é possível concluir que os grandes veículos de comunicação, que derivam de grandes conglomerados midiáticos, não são tão plurais como uma Democracia pede. 

A imprensa forma a opinião pública. 

As Organizações Globo, o Grupo Folha, o Grupo Estado, o Grupo Abril e o Grupo RBS possuem os meios de comunicação com mais audiência do país. Somente cinco grupos, controlados por cinco famílias. Supondo que existisse uma incrível diversidade de pontos de vista nesses cinco grupos midiáticos, é possível representar a diversidade da sociedade brasileira em cinco meios de comunicação? É difícil. Quase impossível. E é nesse ponto que a concentração da audiência em poucos meios de comunicação limita a Democracia. Ela supõe o contrário da pluralidade informativa (que existe na Internet, por exemplo, onde convivem diversos pontos vista, enfoques, realidades, etc.) e não permite a diversidade na formação da opinião pública. Ou seja, cria o sistema de pensamento único, o que é típico de Ditaduras, não do Estado Democrático de Direito.

Numa Democracia, a sociedade tem o direito de ser informada, assim como a imprensa tem o direito de informar. Mas, no Brasil, a liberdade de imprensa é usada principalmente pela imprensa e só chega em seu estado puro aos cidadãos que conhecem a conduta dos principais meios de comunicação do país. Aqueles que se limitam a ler somente os principais meios de comunicação do Brasil acabam limitados à visão dos mesmos, enquanto ignoram ou desconhecem outras realidades, outros enfoques, outras informações. E é por isso que a pluralidade informativa é essencial nos principais meios de comunicação do país.

O Instituto Millenium reúne a imprensa, que está estruturada em um oligopólio.

Aqui, o enfoque usado pelos grandes meios de comunicação é muito parecido um com o outro. Isso é consequência da concentração de meios de comunicação. Poucos jornais, com muita audiência, resultam em poucos pontos de vista transmitidos de forma massiva. É uma consequência da expansão de certos meios de comunicação durante o século XX. A Internet então aparece para quebrar esse modelo. Mas, com credibilidade estabelecida, os grandes meios de comunicação também mantém a liderança na audiência da Internet. Então o sistema de oligopólio continua igual.

É então que surge a necessidade de inovar. De fortalecer a Democracia apostando na diversidade, na pluralidade de enfoque e na liberdade de imprensa (que também é direito do cidadão!). E é isso que significa “democratizar” os meios de comunicação. Trata-se de abrir espaço para outras empresas da informação, possibilitando a concorrência leal e permitindo que o cidadão desfrute de seu direito de se informar. E só há uma forma de conseguir isso: limitando as propriedades dos grandes conglomerados.

Foto da plataforma que luta pela Democratização da Mídia

Feito isso, as famílias que controlam os grupos (entre as quais está a família Marinho, a mais rica do Brasil segundo a Forbes, que controla as Organizações Globo) deverão vender propriedades para se adequar à nova legislação. Eles têm muito a perder, claro; por isso se opõem completamente à qualquer medida que tente mudar a situação atual; mas a sociedade só tem a ganhar. Seria o fim do oligopólio dos meios de comunicação e o começo do crescimento de outros jornais que aparecerão, possivelmente, com outros pontos de vista; ampliando, dessa forma, a diversidade de opiniões e pontos de vista no setor responsável por formar a opinião pública. Ou seja, aumentando o grau de democratização do Brasil.

Obviamente se trata de uma medida que exige muita vigilância por parte da sociedade, pois o oportunismo de alguns pode fazer o projeto perder o foco. O Projeto de Lei de regulamentação dos meios de comunicação deve manter sua base na Constituição de 88, que, além de proibir a formação de monopólio e oligopólio no setor da comunicação, garante os princípios democráticos vigentes hoje em dia. Somente dessa forma é possível avançar ao invés de retroceder. E somente dessa forma o esforço das pessoas por democratizar a mídia teria êxito.

O problema é que aqueles que deveriam informar sobre a necessidade de democratizar a mídia são justamente os mesmos que têm interesses materiais em jogo com essas mudanças. Por isso lutarão com unhas e dentes para evitar qualquer medida que afete seus negócios. E por isso dirão que essa medida significa censura. Mas é justamente o contrário. Lendo o atual projeto de democratização da mídia, feito pelo ex-ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, é possível ver como o texto está baseado nos princípios democráticos e não cita censura. A própria presidenta Dilma Rousseff pediu que o texto fosse estudado com “pente fino” para que não exista possibilidade de que alguém interprete partes dele como censura.

Trata-se de um debate que vem ganhando corpo na sociedade civil, que já desenvolveu uma plataforma para exigir a regulamentação da mídia. O debate continua atual e os grandes meios de comunicação continuam “censurando” o tema para mantê-lo longe dos holofotes. Mesmo assim, a luta continua e a sociedade deverá insistir caso queria implantar a pluralidade informativa no Brasil. Com ela, a Democracia se fortalece e o poder dos grandes conglomerados midiáticos diminui, o que é positivo para a sociedade, que passará a receber informações diferentes, e positivo para o Brasil.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Manifestações anti-Copa: causas justas e panorama geral

O post de ontem tratou sobre a questão da consciência política que a Copa do Mundo despertou nos brasileiros. As manifestações anti-Copa são um exemplo disso. Elas foram realizadas nessa quinta-feira, 15 de maio, pelo Comitê Popular da Copa SP; uma articulação horizontal e apartidária de movimento sociais, coletivos e indivíduos, segundo o manifesto publicado ontem. Esse comitê mostrou o real descontento de muitas pessoas com a Copa do Mundo, sentimento que tem uma base real e justa exposta no manifesto 15M. Isso porque a Copa do Mundo criou injustiças para ser realizada. E essas injustiças acabaram ofuscando os benefícios do maior evento futebolístico do mundo.

Imagem oficial da manifestação de ontem. Retirada da página do Facebook do Comitê


As principais injustiças do Mundial apareceram no manifesto de 11 causas dos protestos de ontem, realizado pelo próprio Comitê Popular da Copa. Uma das principais delas é o fato da FIFA e seus parceiros comerciais não pagarem impostos no Brasil, medida que já foi considerada inconstitucional pelo Ministério Público, e que torna esse mundial de 2014 o mais lucrativo para essa entidade “sem fins lucrativos”. Com isso, a FIFA vai faturar, no mínimo, 8,8 bilhões de reais. Ora, os brasileiros trabalham 5 meses por ano para pagar seus impostos e a FIFA e suas “amigas” comerciais, que com certeza tem dinheiro no caixa, podem vir fazer o evento sem contribuir com a economia nacional? Isso mostra que não é só a Globo que pode sonegar impostos impunemente aqui no Brasil. A Lei Geral da Copa cria esse benefício que é inadmissível. As manifestações de ontem pedem revogação desta lei e a auditoria popular da dívida pública nos três níveis de governo, de modo a investigar e publicizar as informações sobre os gastos públicos com megaeventos e megaprojetos, com o objetivo de reverter o legado de dívida da Copa da Fifa”, segundo manifesto do Comitê Popular da Copa.

A campanha anti-Copa da mídia contribui para esse sentimento de indignação geral. Diariamente a sociedade recebe notícias negativas da Copa, o que serve de arma política para a oposição (nela se incluem os grandes meios de comunicação), que não duvidam em criticar o Partido dos Trabalhadores por cada pequeno problema do país. Isso explica o enfoque dado às manifestações de ontem. Eles se aproveitam dos atos, destacam fotos caóticas e mostram como o Brasil “está mal nas mãos do PT”. Enquanto isso, ignoram que a FIFA e o Governo (Governo no geral, Senado, Congresso e Executivo) criaram, com a Lei Geral da Copa, um raio de 2 Km em que os 20 patrocinadores do evento tem exclusividade de venda de produtos. Mas, claro, a Grande Imprensa apóia a FIFA (a Globo faz parte dos parceiros comerciais da entidade e também aproveita a isenção de impostos) e não divulgaria essas informações que são de claro interesse comercial da máxima entidade do futebol mundial. Mas, independente disso, essa medida significa o fim dos negócios ambulantes nessas áreas, dos quais dependem muitas famílias (138 mil na capital paulista, segundo contabilização do Comitê Popular da Copa). E também significa falta de concorrência e monopólio comercial para uma das mais poderosas entidades do mundo e seus patrocinadores. Ganham as grandes empresas, perde o Brasil.

Tendo isso em mente, cabe ressaltar as remoções em massa que as distintas esferas do Governo vêm promovendo ou aceitando nos últimos meses. Segundo o manifesto 15M, “250 mil pessoas já foram removidas e estão ameaçadas de remoção forçada por obras de megaeventos no Brasil”. É hora do Estado cuidar de seu povo e conceder moradia digna aos despejados, assim como o manifesto 15M exige. Para isso, os manifestantes pedem “realocação chave-a-chave de todas as famílias removidas, com moradia digna, e o fim dos despejos e remoções forçadas até que a moradia seja garantida para todos!”. Trata-se de uma exigência justa e digna de um Estado de Direito, onde não se encaixam as remoções forçadas e a falta de zelo de um Estado que sabe oprimir, mas resiste em ajudar. O Governo tem tanta facilidade em mandar a Polícia despejar e tanta dificuldade em ajudar essas pessoas despejadas que somente com exigências em massa será possível mostrar que o povo tem mais valor que qualquer empresa internacional. Colocando ênfase nessa questão, será possível conseguir melhores condições de vida para essas pessoas que não tem nem onde morar. Além disso, o manifesto pede melhoras condições para os sem-teto, o que se traduz em: garantia de trabalho e albergues dignos.

Sem-tetos da ocupação Copa sem Povo protestam.Foto do Estadão.


Tendo em vista o turismo sexual com a Copa do Mundo, os manifestantes exigem “políticas sérias de prevenção e combate à exploração sexual e ao tráfico de pessoas, com campanhas nas escolas da rede pública, rede hoteleira, proximidades dos estádios e nas regiões turísticas, incluindo a capacitação dos profissionais do turismo e da rede hoteleira e o fortalecimento e ampliação das políticas de promoção dos direitos de mulheres, crianças e adolescentes e população LGBT”. Isso porque os índices de turismo sexual e de pedofilia costumam aumentar com a realização de mega-eventos como a Copa. Foi assim na África do Sul e a previsão é de que seja assim no Brasil. Mais que um problema, a Copa nesse caso é uma oportunidade de criar um programa efetivo contra a exploração sexual de pessoas. Mas claro que essa oportunidade necessita do apoio popular, assim como todas as outras. E daí a importância de manifestações como as de ontem.

Do mesmo modo, os manifestantes aproveitaram para exigir preços populares nas novas arenas “padrão FIFA”. Isso porque a Copa do Mundo vai “elitizar”o principal esporte nacional cobrando preços caríssimos e deixando para fora a grande maioria dos torcedores, que são os verdadeiros frequentadores dos estádios na atualidade. Estádios como o do Corinthians cobram de 50 a 150 reais por um ingresso. Por isso, os manifestantes pedem preços populares nos estádios e respeito às práticas das torcidas. Claro que antes é necessário um estudo e planejamento, de forma que seja possível conciliar a manutenção de preços e a volta das famílias aos estádios. O futebol nacional tem muito a ganhar com esse ponto.

A Desmilitarização da Polícia e a Democratização dos meios de comunicação, típicas pautas atuais da esquerda nacional, também entraram nas exigências dos manifestantes. Mas trata-se de um assunto que deve ser resolvido com paciência, compreensão e tolerância com as opiniões alheias, caso contrário existirão debates e mais debates sem conclusões concretas. Considerando os interesses e vontades de todos coletivos envolvidos nesse assunto, seria possível chegar a conclusões benéficas para o país. Atualmente existem movimentos que levantam essas duas bandeiras. Todos saem da esquerda política e demonstram com argumentos que é necessário rever a atual forma de gestionar e regular a Polícia e a imprensa (ambos têm legislações criadas no período ditatorial, o que não compactua com a Democracia do século XXI e favorece casos de abuso de autoridade e concentração da informação). Mas são assuntos à parte, que não serão tratados no contexto da Copa do Mundo.


Um último ponto tratado no manifesto é a exigência da “Tarifa Zero” no transporte público, tema que entrou em pauta nas grandes manifestações de junho do ano passado. Trata-se de um tema útil e necessário, mas que também ficará à parte e será resolvido fora do contexto da Copa do Mundo. Independente disso, todas exigências do “Manifesto 15M” são justas e dignas de respeito. Devem ser bem estudadas e difundidas para que a sociedade exija justiça e possa “desfrutar” de uma Copa do Mundo sem se indignar com medidas que só favorecem os interesses privados.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

O Brasil ganhou consciência política com a Copa do Mundo

Todos conseguem ver que a Copa do Mundo desse ano tem um sabor diferente para nós, brasileiros. Não existe mais aquela euforia geral, aquela emoção causada pelo “sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor” ou o velho sentimento de felicidade criado pelo sistema do pão e circo. Não. Não nessa Copa, como concorda Humberto Miranda no Blog de Juca Kfouri do UOL. As coisas estão diferentes, justamente porque, dessa vez, o Brasil é sede do evento. Os brasileiros são anfitriões, e, assim como todo anfitrião, eles desejam limpar a casa antes de receber visitas. Entretanto, é impossível que um país com sujeira e problemas acumulados por 500 anos simplesmente consiga limpar a casa em 7 anos. É impossível. E isso faz os brasileiros olharem para o próprio umbigo e pensarem: “as pessoas vão ver tudo que nós sofremos! Que vergonha; imagina um alemão passeando pelo centro de São Paulo e pegando um ônibus lotado. Coitado”.

O "Imagina na Copa" é um projeto social que busca mudar a realidade do Brasil

Coitado nada. Coitados dos brasileiros! Eles que sofrem com isso todos os dias. Os europeus e demais turistas ficarão 40 dias e vão voltar para suas cidades lindas e cheias de virtudes e de justiça. Mas os brasileiros continuarão aqui com os problemas de sempre. Por isso essa mentalidade política que vem se despertando é extremamente benéfica. Com ela é possível criticar os governos para exigir melhoras. E, acreditem, isso é algo que resolve problemas. Esconder tudo embaixo do tapete e continuar a vida como se nada tivesse acontecido só serve para manter a situação atual. E ninguém está feliz com a situação atual. Esconder problemas nunca ajuda a resolvê-los, mas apontar para esses problemas e mostrar ao mundo o que o povo passa todo dia, sim.

O Brasil tem muitos problemas que sempre escondeu do mundo usando máscaras. Máscara do Carnaval, do samba, do futebol e das mulheres lindas. É como um monstro que, por ser feio, dizia que tinha características bonitas para não se sentir mal consigo mesmo. E, agora que o monstro aparece nos holofotes do mundo inteiro, a feiura aparece, e ele sente vergonha por ter traços tão feios. Tanto, que até desistiu de mostrar como é bonito e passou a se lamentar e revoltar por ser assim. Reconhecer erros e defeitos de si mesmo machuca, por isso esse monstro chamado Brasil tem tantos sentimentos ruins relacionados com a Copa do Mundo. Ela o obriga a se auto-analisar!

Mas pouco a pouco o monstro vai perceber que reconhecer os problemas e defeitos é o primeiro passo para superá-los. Vai jogar fora todas as máscaras e aparecerá ao mundo tal como ele é: um país com virtudes e defeitos múltiplos. Todos conhecerão o verdadeiro Brasil e, no fundo, terão carinho por essa mistura louca de pessoas, crenças, situações, desejos, idéias, etc. E isso é fruto do reconhecimento que o próprio brasileiro tem. Reconhece os limites de sua nação e vai exigir mudanças gerais e profundas, pedindo melhoras para todas as pessoas desse país. Algo único na história do Brasil!

Quando já se viu as classes ricas se preocupando tanto com as condições dos pobres? Quando um rico pediu saúde, transporte e educação de qualidade? Poucas vezes na história as classes médias e altas se indignaram tanto com a precária situação dos serviços públicos do país (principalmente porque elas não costumam utilizá-los, pois optam pela versão privada desses serviços). Mas, ao imaginar cidadãos de primeiro mundo passeando por nossas ruas de terceiro, se revoltam e passam a exigir (com razão) serviços proporcionais aos tributos que pagam constantemente. E quem se beneficia com isso são os mais necessitados, que dependem desses serviços em seu cotidiano. E então, com esse sentimento de querer o que merece, o Brasil deixa de desejar ser campeão mundial de futebol para tentar melhorar os serviços do país.

A sociedade quer "padrão FIFA" nos serviços públicos, como diz essa reportagem da  revista Istoé

A atual postura da imprensa favorece essa situação. Cada notícia publicada pela Grande Imprensa reforça a ideia de que o país está um caos, o que serve de arma política para os barões da comunicação, que não duvidam em culpar o governo do PT por todos males possíveis. Mas essa postura da imprensa também é benéfica para o país, pois da repercussão aos movimentos sociais e põe ênfase nos problemas que devem ser encarados e resolvidos, algo que é deixado de lado quando os interesses dos manifestantes não correspondem com os dos grandes meios de comunicação do país.

Essa “cobertura do caos” que a imprensa promove atualmente põe luz em partes feias do Brasil, o que causa indignação da população e desejo de melhora. Dessa forma, erros são reconhecidos e exigências são manifestadas, o que é muito saudável para a Democracia. O brasileiro precisou desses eventos para acordar e perceber os pontos negativos do país. Ao invés de tentar esncondê-los, como sempre fez. Se a Copa fosse em outro país, a população estaria enfeitando carros e ruas para criar um dos poucos momentos patrióticos do país. Mas não. Hoje, ao invés de enfeites, existem queixas. Ao invés de cerveja e samba, existem manifestações e exigências. Ao invés de pão e circo, existe consciência social e política.

Esse talvez seja o melhor legado da Copa. Que, por ser intangível, não pode ser medido ou claramente detectado. O Brasil acordou e, depois de pagar a hospedagem do hotel 5 estrelas que frequentou durante o sono, quer rapidamente que o Governo sirva café da manhã, almoço e jantar de primeira qualidade, de acordo com o preço que pagou. Não se contentará com pouco, o que motiva a criação de Foros e encontros que estudem diferentes temas de diferentes áreas para propor medidas profundas como uma reforma política. Ou até mais! O descontento da população é tão grande que somente uma transformação completa poderia agradar os cidadãos. Significa reformar o Estado. Refundar o Brasil se baseando nos princípios democráticos da Constituição de 88, mas com aquele ar tecnológico e representativo que o século XXI exige. Nesse sentido, somente uma Assembléia Constituinte Exclusiva poderia dar aos brasileiros reformas tão complexas e variadas como as que apareceram em junho do ano passado. Outras medidas seriam insuficientes: seria o mesmo que tratar um câncer com aspirina: seria bom, mas não resolve os grandes problemas nacionais.

O Congresso não representa a sociedade. O Senado, tampouco. O tempo passa e os votos não colocam representantes dos negros, índios, gays e outros coletivos. Com o interesse político que cada cidadão vem desenvolvendo em si nos últimos tempos, em pouco tempo as pessoas começarão a entender que o atual sistema nunca livrou o país da Ditadura. Pelo contrário. Foi uma transição tão lenta e gradual que não se completou até hoje. Por isso o país está tão atrasado em certas áreas. 

Enfim, por mais que a FIFA esteja lucrando milhões com isenção de impostos enquanto não ajuda nem vendedores ambulantes ao redor dos estádios (a Lei Geral da Copa só permite comércios da FIFA na região do estádio); por mais que os elefantes brancos sejam dignos de pena e o padrão dos estádios não corresponda com o padrão dos serviços públicos do país; a Copa deixará um legado. Se é positivo ou negativo, só o tempo dirá. Mas essa consciência que aparece com a chegada dos grandes eventos já é boa para o Brasil, que, mais que nunca, vai começar a exigir do Estado tudo aquilo que o Estado exige dele.